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PATRIMÓNIO


BIBLIOTECA DAS CORTES

CASTRO, José Cardoso Vieira de – A República. Porto : Typographia Lusitana, 1869. 58 p. Cota: 139/1900 (12) (1901-1925).

O mês de outubro destaca-se no calendário português pelo seu dia 5. Decorria o ano de 1910, um dia marcado por grande agitação e euforia, quando a monarquia é derrubada e uma república é declarada. É implementada a República Portuguesa.

Em todas as revoluções, existem vencedores e vencidos, quem esteja a favor e quem esteja contra. Neste folheto, publicado em 1869, décadas antes da implementação da República em Portugal, podemos ler linhas fervorosas de Vieira de Castro proclamando a República como uma verdade e que substitui as monarquias existentes da época. Com convicção, declara: «venho defender a Republica, porque é ela a consagração do direito máximo; porque é ela o Pactolo da instrução universal, sua alimentação e sua eterna sede; porque é ela ainda o grito de morte inexorável contra todos os feudalismos, a expropriação social de todos os cesarismos anacrónicos, a condenação irremissível de todos os vadiismos políticos e de todos os servilismos cortesãos; porque é ela enfim, e só ela, a verdadeira apoteose e o verdadeiro verbo da liberdade, a coroação augusta da única realeza possível depois da Divindade, a realeza do individuo!»

Comparando, Vieira de Castro indica que, enquanto a Monarquia ama o seu rei, exalta a dedicação do homem pelo homem e que a sua salvação se alicerça na hereditariedade da sua dinastia, a República é o oposto, ela «adora a Pátria, sacrifica-se pelo Estado, e não se salva senão pela Lei, que quer dizer Justiça e Egualdade, dualismo poderoso […]. A República não reconhece senão uma aristocracia social, a do talento. Não proclama senão uma virtude cívica, a do trabalho. Só conhece uma religião verdadeira, a da honra. […] A República repele como absurdo estúpido as aristocracias azuis, ou de qualquer cor, das monarquias pueris e ignaras que se gastam a rebalsar no serrabulho de suas heráldicas o sangue mais puro ou menos limpo.»

A 5 de outubro de 2023, completam-se 113 anos desde que se deu a Implementação da República em Portugal, história conhecida de todos os portugueses. Mas, através deste pequeno folheto, com uma vigorosa agitação do autor, podemos conhecer uma das visões e apoio mais possante que antecedeu a sua implementação.

Castro, José Cardoso Vieira de (1838-1872) Advogado, político e escritor.

Nasceu no Porto a 2 de janeiro de 1838 e morreu no exílio em Luanda, a 7 de outubro de 1872, depois de um crime passional que emocionou os círculos cultos portugueses e brasileiros. Estudou Direito na Universidade de Coimbra, tendo obtido o grau de licenciatura, no ano de 1864, onde se notabilizou primeiro pela sua rebeldia e de onde foi repetidamente expulso. Mais tarde viria a ficar conhecido pela sua vivacidade intelectual, facilidade da palavra e tendências rebuscadas do seu estilo literário. 

No mesmo ano da sua licenciatura, foi eleito deputado por Fafe. Na Câmara dos Deputados distinguiu-se pela sua eloquência pomposa, pronunciando alguns discursos memoráveis, como o da defesa das leis de desamortização e o da liberdade de imprensa.

Em 1869 imprimiu na cidade do Porto, o folheto com o título A República, inspirado na sua visita aos Estados Unidos. 

Escreveu para o Atheneu e para o Nacional do Porto.

Foi julgado e preso em novembro de 1870 pelo assassinato de sua mulher Claudina Adelaide Gonçalves Guimarães. Condenado a 10 anos de degredo na África Ocidental, saiu de Portugal com projetos de vida nova.

Camilo Castelo Branco, dedicado amigo e defensor entusiasta de Vieira de Castro, consagrou-lhe algumas palavras brilhantes e fez dele o protagonista do seu drama O Condenado e do seu conto Voltarei, ó Cristo?.

A tragédia de Vieira de Castro teve reflexos na literatura de ficção daquela época, período de grande efervescência literária e de renovação de processos e de temas, entre os quais O Mistério da Estrada de Sintra, O Primo Basílio e A Tragédia da Rua das Flores.

João Carlos Sanches

O exemplar presente na coleção da Biblioteca Passos Manuel, está disponível em cópia digital

A Biblioteca Passos Manuel tem vindo a digitalizar títulos que se encontram em domínio público, quer provenientes da coleção da Biblioteca das Cortes, quer pertencentes a espólios à sua guarda. Os exemplares digitalizados ficam disponíveis em acesso público, universal e gratuito a partir do catálogo bibliográfico, do Registo Nacional de Objetos Digitais e da Europeana. Nesta secção destacam-se alguns desses títulos.



PEÇA DO MÊS


“Pela República” (abril de 1910), Roque Gameiro (1864 - 1935), Gravura litográfica impressa em papel – gravador Pires Marinho (1857-1929?),
63,5 x 49,5 cm,
Inv.º MAR 5593

PELA REPÚBLICA

Para assinalar o 113.º aniversário da Implantação da República, apresentamos a gravura «Pela República» (título do autor), uma obra do mestre Alfredo Roque Gameiro (1864-1935), datada de abril de 1910, executada por ocasião do congresso do Partido Republicano, realizado no Porto, nos dias 29 e 30 de abril. 

Trata-se de uma composição alegórica de homenagem à República, devidamente enquadrada na iconografia característica da época, para a promoção dos ideais republicanos, com destaque para os membros do Partido Republicano, cinco meses antes da queda da monarquia.

Ao centro, com destaque, a figura alegórica da República apresenta-se seminua, erguendo uma espada na mão direita e na mão esquerda uma bandeira que ostenta as cores vermelha e verde. À direita da figura da República, sobre um plinto, encontra-se um livro aberto, em plano inclinado, onde na página esquerda podemos ler «Liberdade/ Egualdade/ E/ Fraternidade» e na página direita «Os/ Direitos/ do/ Homem». Sobreposta a este livro está uma tocha com fogo ardente, símbolo da purificação pelo fogo, a luz que ilumina as trevas e conduz nos caminhos da iniciação, do conhecimento.

Roque Gameiro elaborou várias obras alusivas à República, algumas delas, como a presente, na última fase do regime monárquico, sendo esta a única que retrata um tão grande número de figuras do Partido Republicano, com destaque para a única mulher que integra esta galeria – Ana de Castro Osório (1872-1935), jornalista, escritora, pedagoga, republicana, feminista e ativista dos direitos das mulheres e das crianças. Entre os retratados reconhecemos, em primeiro plano, os principais rostos do Partido Republicano: Inocêncio Camacho, Feio Terenas, Sebastião de Magalhães Lima, Teófilo Braga, Manuel de Arriaga, Consiglieri Pedroso, Basílio Teles, Nunes da Ponte, Guerra Junqueiro, Teixeira de Queiroz, João de Menezes, Brito Camacho, Anselmo Braamcamp Freire, Bernardino Machado, Azevedo Albuquerque, António José de Almeida, Estevão Pais de Vasconcelos, França Borges, Afonso Costa, Aresta Branco, João Chagas, Alexandre Braga, José Relvas e Augusto Monjardino. À semelhança destes, todos os retratados foram identificados pelo autor.

Na legenda da litografia, ao centro e com grande destaque, está o título Pela República. Ainda ao centro da margem inferior pode ler-se «Propriedade registada e prohibida a reprodução em quaisquer dimensões/ Depositaria: Empreza da História de Portugal, Rua Augusta, 95». Na margem à direita, está a identificação «Lith. De Portugal» e à esquerda «Typ. Do Annuario Commercial, Praça dos Restauradores, 27, Lisboa.»

Esta gravura, proveniente do espólio do Centro Escolar Republicano Elias Garcia, de Lisboa, foi adquirida em 2016. Existem gravuras semelhantes no acervo da Fundação Mário Soares - Coleção António Pedro Vicente - e no Arquivo Histórico Militar.

Desenhador e pintor, Alfredo Roque Gameiro adquiriu reconhecimento e fama como aguarelista. Nasceu em Minde, estudou pintura e desenho na Academia de Belas Artes de Lisboa e, como bolseiro, frequentou a Escola de Artes e Ofícios de Leipzig. Após o regresso a Portugal, foi professor, colaborou com diversos periódicos e ilustrou diversas publicações. Morreu em Lisboa, em 1935.



Joaquim Soares