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Ao longo de mais de 200 anos, várias foram as designações da instituição parlamentar: Cortes, Câmara dos Deputados, Congresso da República ou Assembleia Nacional 1.
Em 1976, a Assembleia Constituinte, eleita por sufrágio direto e universal um ano após a Revolução de 25 de Abril de 1974, consagraria no texto constitucional a designação da futura assembleia parlamentar como “Assembleia da República”.
Nos projetos de Constituição apresentados pelos partidos políticos à Assembleia Constituinte, tinham sido apresentadas três propostas para a designação do novo órgão parlamentar: “Assembleia Legislativa” (CDS e MDP-CDE), “Câmara dos Deputados” (PCP e PPD) e “Assembleia Legislativa Popular” (PS) 2.
A discussão sobre o nome da futura assembleia parlamentar surge na sessão de 10 de março de 1976, após o debate e a votação dos artigos da Constituição relativos à “Assembleia dos Deputados”, a designação que constava no texto apresentado pela 5.ª Comissão 3.
O Deputado José Luís Nunes, em representação do PS, opõe-se à designação “Assembleia dos Deputados”, por considerar, entre outros aspetos, “incorreto e pleonástico” definir-se o órgão pelo nome dos seus membros e não pelas suas competências. Defende a designação “Assembleia Legislativa”, que “de certa maneira, consagra o princípio da repartição dos poderes entre o executivo, o legislativo e o judicial”, sendo ainda utilizada pela população na referência às eleições para a Assembleia como “eleições para a Legislativa”. Rejeita os termos “Assembleia Nacional”, “Parlamento” e “Câmara dos Deputados”, o primeiro pela conotação com o regime ditatorial, o segundo pela associação pejorativa a “discussões intermináveis”, mas também por ser adotado em sistemas bicamerais, e o terceiro igualmente pela ligação ao bicameralismo, pois “pressupõe que haja outras assembleias representativas que não são assembleias dos deputados”.
Pelo PPD, o Deputado Jorge Miranda opõe-se à designação “Assembleia Legislativa”, estando previstos outros órgãos com funções legislativas, como o Conselho da Revolução e o Governo, acrescentando ainda que se trata de uma assembleia que, além de funções legislativas, tem competências políticas e de fiscalização do Executivo.
Anuncia, de seguida, a apresentação de uma proposta do PPD para a designação “Parlamento” como o termo que melhor identifica “uma assembleia representativa democrática, livremente eleita, em que há representação das várias tendências políticas e que pratica e tem competência para praticar atos de decisão efetiva da vida política do País”.
No entanto, Jorge Miranda desvaloriza o debate, salientando que o PPD apenas apresenta esta proposta por a questão ter sido levantada pelo PS e provoca risos na Assembleia com o comentário “Não sei se preferem Cortes…”.
Após várias intervenções sobre esta matéria, o Deputado Independente Mota Pinto apresenta uma nova proposta no sentido de designar a assembleia parlamentar com um nome que ainda não tinha surgido no debate:
“(…) Parlamento tem certas conotações que desagradam, Assembleia Nacional também, Assembleia Legislativa idem, Câmara dos Deputados igualmente, pelo que eu vou ter a audácia de sugerir uma outra denominação (…).
Eu creio que poderíamos chamar à Assembleia Legislativa, pura e simplesmente, Assembleia da República. Assembleia da República, porque é o órgão colegial que exprime e traduz a República.
Há o Presidente da República, uma figura singular, que encabeça e simboliza, portanto, o Estado. E há um órgão colegial que exprime, que é o representante do povo português. Creio que esta expressão, que está em paralelismo com a designação 'Presidente da República', põe em relevo o carácter colegial, reabilita e dá o devido valor a uma fórmula: a palavra 'República', que na história das ideias, que na história das formas de Estado, tem um conteúdo progressista, tem um conteúdo democrático, é sinónimo de democracia em todas as dimensões que a democracia pode exprimir. Por esse motivo, e sem atribuir a este problema nenhuma importância especial, eu sugeriria a fórmula 'Assembleia da República.”
A proposta para a designação “Assembleia da República” é aprovada por unanimidade e aplaudida prolongadamente por todos os Deputados.
A Constituição seria aprovada a 2 de abril e entraria em vigor no dia 25 de abril de 1976, data das primeiras eleições para a Assembleia da República.
Teresa Fonseca
[1] As designações das assembleias parlamentares (sistemas unicameral e bicameral) desde 1821 podem ser consultadas aqui.
[2] O projeto da UDP não previa uma assembleia parlamentar.
[3] A 5.ª comissão elaborou o articulado da Constituição na parte relativa ao órgão parlamentar, inserida no capítulo “Organização do poder político”.