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CONFIRMAÇÃO DE DECRETOS VETADOS


Os Decretos vetados podem ser confirmados pela Assembleia da República.

No passado dia 20 de abril procedeu-se à leitura da mensagem do Presidente da República sobre o Decreto n.º 43/XV/1.ª - "Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e altera o Código Penal". O Decreto foi vetado politicamente depois de uma versão anterior ter sido vetada por inconstitucionalidade.

Face a este veto, nos termos da Constituição, a Assembleia da República poderá alterar o Decreto ou confirmá-lo por maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções 1. Neste caso, de confirmação do Decreto, o Presidente da República deverá promulgar o Decreto no prazo de oito dias a contar da sua receção.

Apesar de não acontecer com frequência, já houve casos de confirmação de decretos. Logo na I Legislatura, o então Presidente da República, Ramalho Eanes, devolveu à Assembleia da República, sem promulgar, o Decreto n.º 205/I/3 – Amnistia de infrações de natureza política, depois de o Conselho da Revolução não se ter pronunciado pela inconstitucionalidade, por defender uma amnistia de âmbito mais restrito."

No debate que se realizou antes da votação de confirmação, o então Deputado Salgado Zenha (PS) lembrou que pela “primeira vez na história portuguesa um diploma legislativo vetado pelo Chefe do Estado é reapreciado pela Câmara Legislativa com vista à sua consolidação. É normal, por isso, que se tenham suscitado interrogações sobre esta novidade da nossa vida política. Enfrentemo-las, por isso, serenamente. Durante o Estado fascista, a Assembleia dita Nacional não passava de mero ornamento decorativo, sem autenticidade democrática nem poderes reais. (…) Porém, hoje a situação é diferente. Vivemos em democracia. A Assembleia da República foi eleita pelo povo e exprime pluripartidária e autenticamente a vontade popular. O Presidente da República foi eleito pelo povo e é um democrata. E a Constituição, ao mesmo tempo que institui o veto presidencial, contrapõe-lhe a faculdade de a Assembleia da República o superar através de uma nova votação com maioria qualificada. Não estranhamos, por isso, e achamos normal que o Presidente da República tivesse vetado a lei da amnistia, aprovada por esta Assembleia em 24 de Abril deste ano. Mas com a mesma normalidade provocamos uma nova apreciação do mesmo diploma, a fim de que a Assembleia sobre ele se pronuncie, nos termos constitucionais.”

Fotografia de Francisco Salgado Zenha

Francisco Salgado Zenha numa importante comunicação do Presidente da República em que revelou os nomes dos principais implicados da tentativa de sublevação armada.
1975-03-11
Fotografia de Miranda Castela - Arquivo Fotográfico da Assembleia da República, PT-AHF/MC/R317/i1695

O Decreto foi confirmado por 137 votos a favor, 87 votos contra e 3 abstenções e deu origem à Lei n.º 74/1979, de 23 de novembro.

Nas II, III e IV Legislaturas, entre 1980 e 1987, sendo ainda Presidente da República, Ramalho Eanes, a Assembleia da República confirmou 3 decretos, um por legislatura, sobre assuntos diversos: Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas; Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos e Licenciamento de estacões emissoras de radiodifusão.

Nas V e VI Legislaturas, entre 1987 e 1995, a Assembleia confirmou o mesmo número de decretos vetados pelo então Presidente da República, Mário Soares: Atribuições, competências, organização e funcionamento da Alta Autoridade para a Comunicação Social; Altera a Lei de Imprensa e Altera a Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa.

Durante os dois mandatos de Jorge Sampaio, entre 1996 e 2006, não foi confirmado qualquer decreto vetado pelo Presidente. Haviam assim de decorrer treze anos antes de a Assembleia confirmar um decreto vetado pelo Presidente da República.

Nas X, XI, XII e XIII Legislaturas, entre 2006 e 2016, sendo Presidente da República Aníbal Cavaco Silva, foram confirmados 5 decretos vetados politicamente: Aprova a terceira revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores; Cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil; Segunda alteração ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, sobre a compensação equitativa relativa à cópia privada; Revogação da lei relativa ao pagamento de taxas moderadoras na interrupção voluntária da gravidez e Elimina as discriminações no acesso à adoção, apadrinhamento civil e demais relações jurídicas familiares.

Na legislatura anterior, XIV, sendo já Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, foi confirmado pela Assembleia o Decreto que alterava as regras de enquadramento de Programa de Apoio à Economia Local.

Regressemos às palavras do Deputado Salgado Zenha, proferidas aquando da primeira confirmação de um decreto vetado pelo Presidente da República:

“Mas hoje nós vivemos em democracia. E a democracia é o reino da sinceridade. Não se diga, por isso, que a nossa atitude significa ou representa um ato de menos respeito para com o Presidente da República. Em democracia, o respeito pelos outros começa pelo respeito por nós próprios.”

Ana Vargas 2

[1] No caso dos decretos que revistam a forma de lei orgânica ou que respeitem a relações externas, limites entre o setor público, o sector privado e o sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção ou a regulamentação dos atos eleitorais previstos na Constituição é necessária a maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.

[2] Dados recolhidos por Cristina Ferreira e Teresa Abraúl, Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar