" />
A construção da Maternidade de Lisboa nos debates parlamentares.
Na sessão de 13 de abril de 1913, é apresentada uma representação da Sociedade de Ciências Médicas para a construção de uma maternidade em Lisboa, propondo-se a designação de Maternidade Alfredo da Costa, em homenagem ao médico e professor que “mais levantou a voz nesta santa obra de proteção devida às grávidas e aos recém-nascidos pobres”.
Defendendo como dever do Estado dar assistência aos “pobres de todas as idades e em todas as circunstâncias da vida” e rejeitando o “conceito esmolar tão deprimente”, a Sociedade de Ciências Médicas apela à “proteção devida às grávidas e aos recém-nascidos pobres”, através da criação de uma maternidade onde sejam asseguradas “consultas externas para as grávidas e para os recém-nascidos, socorros domiciliários, análises e esterilização de leites, inspeção das amas, alimentação de débeis, incubação de prematuros”.
Acusa o Estado de descurar a constituição da “sociedade futura”, deixando morrer, por desleixo, crianças que se poderiam transformar em adultos saudáveis.
Denuncia, de seguida, as condições da enfermaria de Santa Bárbara do Hospital de S. José, que “tem as honras de maternidade de Lisboa”:
“Comecemos por dizer que esta enfermaria se encontra instalada no 6.° andar do Hospital de S. José, sendo necessário para ali chegar, que a grávida, admitida somente nos últimos dias da sua gravidez, a maioria das vezes já em trabalho de parto, suba 14 degraus duma escada estreita e cuja inclinação se aproxima muito da vertical.
E, depois desta difícil e perigosa ascensão, o que vai esta desgraçada encontrar?
Uma sala onde estão instalados 60 leitos, e que em rigor não deveria comportar mais de metade, leitos com 85 centímetros de largura, onde as mães devem estar com os filhos à falta de berços. E nesta sala que na mais criminosa promiscuidade se encontram as grávidas, as puérperas e as operadas.
Quartos de isolamento não há, de modo que todas as doentes, para cujo estado esteja indicado um repouso e tranquilidade absolutos, entram como todas para a enfermaria, onde estão constantemente sendo perturbadas pelo chorar das crianças, e os gritos das que estão em trabalho de parto.”
Prossegue referindo as falhas de eletricidade e de água quente, a ausência de aquecimento e de agasalhos, com mães e crianças a suportar no inverno temperaturas de “5 e de 3 graus”, contribuindo para uma elevada mortalidade infantil (27%).
A 23 de junho de 1913, o Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, Afonso Costa, apresenta emendas ao orçamento do Ministério do Interior, prevendo a construção de uma maternidade em Lisboa.
A construção da Maternidade Alfredo da Costa tem início em 1914, de acordo com um projeto do arquiteto Miguel Ventura Terra. Em consequência de dificuldades financeiras, agravadas pela falta de materiais no período da Grande Guerra, as obras prolongam-se até ao início dos anos 30.
Os reforços orçamentais para esta obra são uma constante no Parlamento da I República.
Dez anos depois, a 10 de maio de 1923, o Deputado Torres Garcia considera irrisória a verba destinada à Maternidade de Lisboa, acusando o Estado de não assegurar a proteção das grávidas e defendendo que as maternidades não se devem limitar ao internamento para o parto:
“Se o Estado continuar a desprezar as obras da Maternidade nós temos o direito de o considerar cúmplice na obra de destruição que se está fazendo. (…)
Quanto a maternidades, como elementos de proteção à mulher grávida o que se tem feito em Portugal? Nada, absolutamente nada, numa sociedade quase feroz, onde ela, desrespeitada e perseguida por todos, sem carinho, sem proteção, sem amparo, tem quase sempre de recorrer ao abortivo, como único remédio e como única salvação.
Depois o simples internamento numa maternidade nas proximidades do parto não pode remediar o mal, porque, antes de atingir o último período de gestação, a mulher já está de há muito impossibilitada de angariar os meios de subsistência, já está corrida e eivada por todos quantos não têm a mais ligeira noção do sentimento.
Urge, pois, encararmos este problema com todo o interesse, dando às maternidades todas as características duma instituição moderna, liberta de todos os preconceitos e daquele cunho acentuadamente morgadio que elas ainda hoje revestem. (…)
Depois a ação das maternidades não pode nem deve limitar-se ao internamento da mulher grávida. Deve ir mais além, até mesmo além do aleitamento.”
Só após o termo da I República, através do Decreto n.º 20 395, de 17 de outubro de 1931, é instituída finalmente a Maternidade Alfredo da Costa. A inauguração teria lugar no ano seguinte e às 23h30 de 8 de dezembro de 1932 nascia ali a primeira criança, com o nome de Maria da Conceição. "Verdadeira casa de repouso, já não temos de invejar os alemães", escrevia o "Diário da Manhã".