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Voto de congratulação pela independência de Angola. Arquivo Histórico Parlamentar.
A independência de Angola (11 de novembro)

Na sessão de 11 de novembro de 1975 foi assinalada a independência de Angola e aprovado um voto de congratulação da iniciativa do PPD.

Mota Pinto (PPD) usou da palavra para se referir à independência de Angola, apresentando o voto de congratulação pelo nascimento daquele novo Estado.


“Um novo Estado de língua portuguesa ascende hoje ao conceito internacional das nações independentes. O Estado Português, em solene proclamação pública, reconheceu o Estado de Angola. O Estado Português, em solene proclamação pública, reconheceu no âmbito do novo Estado a soberania do povo de Angola, a soberania da totalidade do povo de Angola.

É uma política sábia, assente no respeito pelos princípios da autodeterminação dos povos, pelo princípio da não ingerência nos assuntos internos de outras nações, assente no respeito pela letra e pelo espírito dos acordos de Alvor, assente no acatamento dos princípios reconhecidos do direito internacional, o não se ter privilegiado qualquer movimento.

(…)

As circunstâncias em que Angola ascende à independência não são as mais auspiciosas a curto prazo, quando uma guerra fratricida rasga a carne e verte o sangue dos homens e das mulheres angolanas e destrói os seus bens.

Importa, neste momento, formular claramente a intenção de o Governo Português de tudo fazer dentro das suas possibilidades para ajudar a restabelecer a paz em Angola.

(…)

Em nome do Grupo Parlamentar que represento, quero formular um voto de congratulação que lhe vou entregar, Sr. Presidente, pedindo-lhe para, ao abrigo do Regimento, o submeter à aprovação da Assembleia:

A Assembleia Constituinte, na data histórica da proclamação da independência de Angola, saúda fraternalmente o novo Estado africano e manifesta a sua certeza, de que o mesmo saberá encontrar os caminhos do seu futuro através de Órgãos de Soberania verdadeiramente democráticos e representativos da vontade do povo angolano, em paz, progresso e liberdade.”

Submetido à votação, foi aprovado com 19 abstenções (PCP e UDP). Vital Moreira (PCP) justifica o sentido de voto do seu partido.

“Os Deputados do PCP entendem que o que temos com que nos congratular não é com o nascimento de um abstrato Estado de Angola, mas sim com o nascimento da República Popular de Angola. Os Deputados do PCP entendem que a República Popular de Angola já tem no Governo Revolucionário do MPLA as forças verdadeiramente democráticas, revolucionárias e populares.”

De seguida, usa da palavra Galvão de Melo (CDS) sobre o processo de colonização e descolonização:

“Hoje, dia 11 de Novembro de 1975, encerra-se um período histórico da vida dos Portugueses. Um longo período que durou precisamente cinco séculos e sessenta anos, durante os quais homens valorosos – nossos antepassados – descobriram, ocuparam e conservaram vastos territórios distribuídos num mundo antes desconhecido; descobriram, criaram e até há pouco conservaram sociedades e povos das mais diversas gentes.

Hoje, dia 11 de Novembro do ano de 1975, termina o que ainda restava como testemunho nosso, que parecia imperecível e afinal não era, da grande obra dos Portugueses. A obra que, continuada pelas gerações inquebrantáveis do século XV, deu ao Mundo as dimensões que o Mundo ainda tem. A obra ingente, única, que ensinou à Europa os caminhos do Mundo; que de todo o Mundo trouxe à Europa gentes de falas e costumes diversos e riquezas não imaginadas. Esta foi a obra que nenhum outro povo ainda repetiu. Esta foi a grande aventura histórica dos Portugueses, tão grande que quase os consumiu ao consumir suas forças, suas fazendas, suas vidas.

Essa aventura foi – e é – o orgulho da raça portuguesa.

(…)

O colonialismo, que assentava na “ocupação efetiva”, tem dado lugar a um “anticolonialismo” que “aceita” a penetração efetiva de capitais, engenhos e técnicos.

Esta é a nova paz africana, cuja diferença está em que os “empresários” de hoje são mais felizes que os antigos “colonos”, uma vez que só têm de preocupar-se com os “lucros”, pois que as perdas, bem como todas as restantes obrigações, inerentes à vida de um Estado, passaram a ser preocupação e encargo exclusivo dos naturais da terra.

Não digo que seja pior, duvido que seja melhor: para os africanos, claro está.

Esta é a nova paz africana que hoje pôs fim à presença de Portugal na vasta África ainda tão desconhecida.

(…)

Se sou pela democracia, é impossível não estar de acordo com a autodeterminação dos povos africanos. Se sou pela democracia, sem dúvida estou com os povos africanos de Angola, de Moçambique e todos os demais, no seu veemente desejo de autodeterminação: de independência.

Mas não posso estar de acordo com as “independências” que se processaram a ritmo alucinante e, por vezes, em circunstâncias que seriam divertidas, se não estivesse em jogo o destino dramático de um povo: de muitos povos.

E não posso estar de acordo, porque em nenhuma das anunciadas “independências” se teve em conta qualquer elementar princípio de dignidade humana, de diálogo democrático.

Alguém perguntou ao povo, aos diferentes povos interessados, qual a sua opinião e, afinal, decisão? Não.

Não se perguntou aos portugueses colonizadores se a maioria era pela descolonização; e não se perguntou aos africanos colonizados se a maioria era pela descolonização. Não se perguntou a uns e a outros como e em que sentido desejavam ver processar-se a descolonização.

O que se passou foi que uma minoria, composta de revolucionários da primeira hora e “revolucionários” que cautelosamente têm aderido ao longo de mais de um ano, decidiu, e decidiu sozinha, como se a herança de todo um povo fosse sua propriedade, impor um processo e sentido de descolonização. Descolonização, dizem eles.

Segue-se uma intervenção de Vital Moreira (PCP), exigindo que o Governo Português reconheça no MPLA o único Governo legítimo daquele país:

“Hoje, 11 de Novembro de 1975, às 0 horas, o Presidente do MPLA, Agostinho Neto, em nome do povo angolano, proclamou...

Apupos.

... perante a África e o Mundo, a independência de Angola.

Nasce assim a República Popular de Angola, fruto da luta heroica do povo angolano e do seu legítimo representante e vanguarda revolucionária – o MPLA – e expressão dos seus “anseios mais sentidos”.

Celebrando hoje a proclamação da sua independência, o povo angolano culmina vitoriosamente a sua primeira guerra de independência nacional.

A luta do MPLA, iniciada em 4 de Fevereiro de 1961, mereceu sempre o apoio dos comunistas e de outros democratas e revolucionários portugueses e foi um dos fatores, juntamente com a luta dos outros povos das ex-colónias portuguesas, que de diversas formas contribuiu para o derrubamento da ditadura fascista na nossa Pátria.

A história comprovou a justeza da nossa posição e da nossa ação comum. Com a vitória da primeira guerra de libertação do povo angolano e com a proclamação da sua independência nacional realiza-se um dos grandes objetivos comuns. Um dos grandes objetivos comuns de todos aqueles que, nos vários continentes, lutam contra os inimigos comuns nos seus vários aspetos – o imperialismo, o colonialismo, o neocolonialismo e o fascismo.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proclamação da República Popular de Angola é uma grande vitória do heroico povo de Angola e da sua vanguarda revolucionária – o MPLA. É uma grande vitória também para todos aqueles que em Portugal, nas duras condições do fascismo, sempre lutaram contra o colonialismo e contra a guerra colonial. É uma vitória ainda do MFA, dos militares revolucionários que derrubaram a ditadura fascista, instauraram em Portugal as liberdades democráticas, defenderam o direito à autodeterminação e à independência dos povos submetidos ao colonialismo português. É uma vitória para o povo português, que, com o termo da primeira guerra de libertação do povo angolano e com a proclamação da independência da República Popular de Angola, dá um novo passo para a consolidação da própria Revolução, para prosseguir na construção de um Portugal democrático, a caminho do socialismo.

(…)

Por tudo isto, o dever das forças democráticas e revolucionárias portuguesas é apoiar, por todos os meios, a República Popular de Angola e o Governo Revolucionário do MPLA. Por tudo isto, o dever do Estado Português e do Governo Português é – tal como outros Estados progressistas do Mundo – reconhecer imediata e incondicionalmente a República Popular de Angola e o Governo do MPLA.”

Segue-se a saudação de Bento de Azevedo (PS) ao povo angolano.

“O povo de Angola foi um dos povos (…) mais explorados. Pois é este povo irmão que hoje – 11 de Novembro de 1975 –, libertando-se das grilhetas opressoras dos colonialistas e capitalistas que viviam, na sua maior parte, não em Angola, mas opiparamente aqui, em Lisboa, à sombra do Terreiro do Paço – readquiriu a sua independência.

Povo angolano, de largas tradições culturais; país de prodigiosas riquezas; país de promissor futuro.

Desta Assembleia, desta tribuna, em meu nome e em nome dos meus camaradas do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, saudámos-te fraternalmente; saudamos em ti, todos aqueles que combateram – cá como lá – os colonialistas do Terreiro do Paço e os de Angola – que também lá existiam –, com a coragem, a abnegação, a humildade, a persistência e os ideais, dos autênticos e mais puros revolucionários; daqui, desta Assembleia, desta tribuna, homenageamos comovidamente todos aqueles que, em nome da liberdade, da fraternidade e do socialismo, tombaram na luta pela independência de Angola portentosa.

País que já podia ser livre há mais tempo, se livre fosse o amargurado povo português que igualmente passou pelas garras do fascismo, da exploração e do colonialismo. Desta Assembleia, desta tribuna, saudámos-te, povo irmão de Angola!

(…)

Que Angola e Portugal sejam, de facto, marcos autênticos da libertação humana, onde a exploração do homem pelo homem jamais possa existir.”

Por fim, usa da palavra Sá Machado (CDS), criticando o processo de descolonização:

(…)

Quando hoje a bandeira portuguesa foi arriada dos mastros onde tremulou durante 500 anos, no termo de um processo de descolonização que se apregoou como exemplar, receamos muito que esse ato não tenha tido outro significado que o lavar das mãos de Pilatos.

Deixámos para trás os milhares de mortos que apodrecem nas ruas das cidades ou nos caminhos do mato, o drama sombrio dos refugiados e, para o povo angolano, num país dividido, a certeza da guerra civil e do seu trágico cortejo de desgraça.

(…)

Portugal não só não soube ou foi capaz de assegurar a expressão livre e pacífica da vontade do povo de Angola, mas, pelo favorecimento ilegítimo e sectário de um dos movimentos, contribuiu para a criação das condições que conduziram à guerra civil, ao trágico êxodo da população branca, à eventual vietnamização ou secessão do território.

E, no entanto, voltamos a repeti-lo, condições existiam para uma descolonização responsável e pacífica, de entre as quais quero destacar, por imperativo de justiça elementar, o comportamento da população branca, a quem presto, nesta hora, comovida homenagem.

(…)

Resta-nos esperar e confiar que o povo de Angola, a quem os portugueses se encontram ligados por laços profundos, que nem a guerra, o sectarismo, o desrespeito ou a intolerância conseguirão desatar, reencontre os caminhos da paz e da unidade para que Angola possa vir a ser, em breve, o país generoso, grande e fraterno que a comunidade dos homens espera das virtudes e da sabedoria tradicionais do seu povo.”

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