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Cartaz comemorativo do 3.º aniversário do 25 de Abril, Sebastião Rodrigues, 1977, Comissão Nacional de Eleições.
Primeira sessão solene comemorativa do 25 de Abril, 26 de abril de 1977, Arquivo Histórico Parlamentar.
A PRIMEIRA SESSÃO SOLENE COMEMORATIVA DO 25 DE ABRIL
A primeira sessão solene comemorativa do 25 de Abril realizou-se na Assembleia da República no dia 26 de abril de 1977, três anos após a revolução que marcou o início do período democrático em Portugal.
Encerrado o ciclo da aprovação da Constituição da República Portuguesa, que entrara em vigor um ano antes, e das primeiras eleições livres – Assembleia Constituinte (25-04-1975), Assembleia da República (25-04-1976), Presidente da República (27-06-1976), Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira (27-06-1976), Autarquias Locais (12-12-1976) – as intervenções refletem ainda o período revolucionário do pós-25 de Abril.
A Assembleia da República, presidida por Vasco da Gama Fernandes, tinha a seguinte composição:
Partido Socialista (PS) – 107 deputados
Partido Social-Democrata (PSD) – 73 deputados
Centro Democrático Social (CDS) – 42 deputados
Partido Comunista Português (PCP) – 40 deputados
União Democrática Popular (UDP) – 1 deputado
O representante da UDP, Acácio Barreiros, é o primeiro a usar da palavra, criticando uma política que considera de concessões aos grandes capitalistas e agrários e à ingerência externa: “O povo português não quer a anarquia e o caos, pois o que pretende é ter a certeza de que o esforço do seu trabalho serve para edificar a pátria livre e socialista por que luta. Por isso nós dizemos, baseados na experiência destes três anos, que a única política capaz de galvanizar o povo de Norte a Sul, no continente e nas ilhas assenta em três pontos fundamentais: os ricos que paguem a crise; para que o povo seja livre há que reprimir os fascistas; imperialistas fora de Portugal.”
Octávio Pato (PCP), após evocar o 25 de Abril, apresenta as “amplas liberdades democráticas” conquistadas após a Revolução: partidos políticos, organizações de trabalhadores, controlo operário, nacionalizações, reforma agrária, democratização da educação e da cultura. Salienta o fim da guerra colonial com “o caráter e a importância de realização central da revolução portuguesa”. Termina, afirmando: “Hoje, nas cidades, nas vilas e nos campos do Portugal liberto, o povo português, as forças democráticas, as forças armadas, as instituições e Órgãos de Soberania do regime democrático estão proclamando solenemente, contra dúvidas e desânimos, contra ações ou ameaças terroristas, contra conspirações reacionárias, contra calúnias e insultos, contra propósitos de desforra e de vingança, que a democracia não se submete, que o 25 de Abril não se rende, que em Portugal haverá 25 de Abril sempre!”
Segue-se o discurso de Sá Machado, em representação do CDS, apontando “desvios que perverteram a Revolução” e assinalando o contributo do seu partido, “uma alternativa não socialista, europeia e cristã-democrata”, para preservar a dimensão democrática, popular e patriótica do 25 de Abril. Aponta as conquistas da Revolução: “(…) a devolução da soberania a um povo (…); a elaboração de uma Constituição (…); o reconhecimento do valor e da dignidade essenciais da pessoa humana (…); a consagração do princípio da subordinação do poder económico ao poder político; a eleição livre de um Parlamento pluralista, perante o qual o Governo deve ser responsável; a escolha, por sufrágio universal e direto, do Presidente da República (…); a abertura de profundas perspetivas para a conquista de novas fronteiras de participação e presença dos trabalhadores na vida coletiva; a criação de condições para fundas reformas estruturais da nossa sociedade; o estabelecimento da paz e o reconhecimento pelo Estado português do direito de todos os povos à autodeterminação e à independência; a abertura de Portugal a todas as nações do mundo. (…)”
Barbosa de Melo, em representação do PSD, avança três lições que se retiram da Revolução de 25 de Abril: “(…) A primeira tem a ver com o merecimento e o êxito da luta pela liberdade política. Gerações e gerações de resistentes e inconformados, sem deitar conta a renúncias e provações, a torturas e à morte, mantiveram o ânimo e a decisão de restituir a uma pátria oprimida a sua liberdade perdida. (…) O 25 de Abril foi o coroar desse calvário de coragem e de esperanças. (…) A segunda lição tem a ver com a necessidade do funcionamento e eficiência dos sistemas políticos. (…) Foi quando se tornou clara a incapacidade do sistema para vencer uma crise nacional centrada numa economia bloqueada e numa guerra absurda e sem saída que o conjunto das forças armadas ganhou consciência e alento para o derrube. O braço armado da Nação pôde ser assim acionado eficazmente quando o regime se revelou incapacitado para resolver os problemas vitais do povo. A terceira lição tem a ver com o sentimento de liberdade inerente ao Povo português. Os acontecimentos do 25 de Abril, na verdade, revelaram também que a opressão, sobre ser contra a natureza moral do homem, fere um sentimento espontâneo hoje muito caro aos Portugueses. (…)”
Salgado Zenha (PS) defende a construção de um “projeto comum realizado em liberdade e emergente da vontade popular”. Argumenta: “A liberdade não é só a abolição da tirania, é também transformar a esperança em realidade. A tirania instala-se um dia e pode durar um século. O sonho, a esperança, o desejo não ganham corpo num espasmo de cólera, de ira ou de força. A esperança não se plasma no concreto por nenhuma técnica explosiva, mas tão só pela prática implosiva da persistência, do trabalho, do estudo e da inteligência.
Essa esperança para nós, socialistas, é o socialismo em liberdade. Em liberdade porque não consentiremos que ela jamais desapareça da terra portuguesa. Liberdade é, antes de tudo, tolerância. Não há liberdade sem tolerância. (…) A liberdade só se instaura pelo exercício da liberdade. É um atentado à inteligência humana pretender-se que de um qualquer despotismo, mesmo que supostamente iluminado ou progressista, poderá um dia desabrochar a liberdade – espontânea e anestesicamente. A liberdade gera liberdade. A ditadura reproduz a ditadura.”
O Presidente da Assembleia da República, Vasco da Gama Fernandes, descreve a sua vivência da manhã do 25 de Abril: “Na madrugada do dia 25 de Abril acordei estremunhado com a notícia de que o Exército se revoltara contra a ditadura e se propunha reintegrar Portugal na senda da civilização. Vesti-me à pressa e no fim da madrugada estava no único posto que me era acessível: a redação do jornal
A República
, velho baluarte indomável e indomado, que, verticalmente, se batera sempre pela dignidade cívica deste país.
Ao subir a minha rua íngreme até atingir a Escola Politécnica quase que me ia faltando o ar.
Sentia sobre o peito o peso de quase cinquenta anos de arbítrio, recordava-me, comovido, da minha vida e dos que eram como eu: uma mocidade sacrificada, muita dela frustrada, o rosário infinito das amarguras e das desilusões passadas pelos seus mortos e pelos que envelheceram na dura caminhada. Lembrei-me das cadeias, minhas e dos outros, as nossas deportações, os longos exílios, a odisseia das famílias, a dor dos amigos. Ao atingir o cimo da calçada, as lágrimas corriam-me pela cara e com elas as lágrimas dos que a mim se juntaram, conhecidos e desconhecidos, como se se tivessem aberto de par em par os gonzos das catacumbas. Seria possível? Teria chegado a hora? O que era aquilo? (…)
Irreversível vitória da liberdade (…)”.
O Presidente da República, Ramalho Eanes, afirma no início do seu discurso: “Esta cerimónia marca o ponto mais alto nos atos com que o povo português tem vindo a celebrar o 25 de Abril. Nos dois anos anteriores o povo celebrou-o exercendo os direitos reassumidos: votou – e através do seu voto ergueu as traves mestras da nova sociedade. Hoje, plenamente instituídos os órgãos do Poder, a Assembleia da República, que em si consubstancia a própria democracia pluralista, culmina as celebrações com esta sessão em que o País está presente nos seus mandatários e nos seus responsáveis.”
Aplaudido de pé por todos os Deputados e pela assistência, Ramalho Eanes termina a sua intervenção: “Só a eficácia da democracia permite manter a estima do povo pelo regime democrático. E é ainda a defesa da democracia que exigirá a procura de alternativas que a garantam. Nesta hora do nosso destino de nação independente, não é legítimo ignorar a crise que nos ameaça: o estado da nossa economia, as contradições que dilaceram a nossa sociedade. Vivemos a primeira oportunidade democrática em meio século. O esforço consciente de cada um fará desta oportunidade uma vitória do povo português e de Portugal.”
Aceda às intervenções integrais da sessão solene
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