"A Paródia", 10 de novembro de 1906, p. 1, HML.
Sessão inaugural da Assembleia Nacional Constituinte, 19 de junho de 1911. "Ilustração Portuguesa", 17 de julho de 1911, p. 80-81, HML.
Busto da República de Simões de Almeida (sobrinho), "Ilustração Portuguesa", 5 de dezembro de 1910, p. 189, HML.
No nicho da Presidência da Sala das Sessões, onde, no período da Monarquia, estava colocada a estátua do rei D. Carlos I, figura agora outro símbolo republicano, o busto da República. Encomendado pelo Parlamento ao escultor João da Silva, sobressai pela sua grande dimensão.
O busto da República é inspirado na imagem da Liberdade na Antiguidade Clássica. A Liberdade apresentava-se como uma mulher, segurando um pileus, barrete usado pelos escravos que recebiam a libertação na Roma antiga. Devido a um erro numa publicação no século XVIII, em que o barrete pileus foi confundido com o barrete frígio, este último passará a ser o símbolo da Liberdade e da República, com uma ampla difusão pela propaganda republicana (1).
Em 1906, a revista A Paródia refere-se ao barrete frígio como o "chapéu da moda", um símbolo da ascensão do partido republicano e do combate político contra o regime monárquico (2).
O primeiro busto da República portuguesa foi concebido por Simões de Almeida (sobrinho), em 1908, ainda no período da Monarquia, na sequência de uma encomenda da primeira vereação republicana da Câmara Municipal de Lisboa. Seria também o primeiro busto a ser exposto num ato oficial após a Revolução Republicana, nos “funerais nacionais” de Cândido dos Reis e Miguel Bombarda.
Em junho de 1911, a Câmara lança um concurso para a conceção do busto oficial da República. Concorrem nove escultores, incluindo o próprio Simões de Almeida (sobrinho), que, com um busto semelhante ao de 1908, se queda pelo segundo lugar, atrás de Francisco dos Santos.
No entanto, seria a obra de Simões de Almeida (sobrinho) a alcançar maior visibilidade e a afirmar-se como o ícone mais representativo da República.
A escultura apresenta-nos uma jovem com o pescoço e os ombros descobertos, o peito envolto por um manto com a esfera armilar ao centro e a cabeça coberta por um barrete frígio.
A modelo do busto é Ilda Puga, uma costureira de 16 anos que trabalhava numa camisaria na baixa lisboeta, frequentada por Simões de Almeida. Só em 1993, com 100 anos, Ilda Puga revela a história numa entrevista à RTP, contando que posava sempre na companhia da mãe e que o escultor apenas lhe moldava o rosto (3).
Além de réplicas das obras classificadas nos dois primeiros lugares no concurso da Câmara, o Parlamento encomendou bustos da República a vários escultores, como o de Tomás Costa, adquirido em 1921 para a Sala do Senado.
Na Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, o busto da autoria de João da Silva é substituído, em 1916, por uma estátua da República de corpo inteiro. A escultura vencedora no concurso lançado pelo Parlamento, da autoria de Anjos Teixeira, mantém-se ainda hoje no Hemiciclo.
(1) O barrete frígio é também comum na Antiguidade, mas tem um formato diferente, distinguindo-se do pileus pela curvatura na parte superior. O simbolismo também difere, pois o barrete frígio identifica geralmente "personagens reais ou imaginárias e entidades divinas de origem não ocidental". Mourão, Cátia – "Um rosto e um corpo para a República: os concursos para o busto oficial e para a estátua da República portuguesa". In Manuel de Arriaga: a construção da imagem da República. Lisboa, Caleidoscópio, 2017, p. 76. Curiosamente, o barrete frígio pode ser encontrado nas personagens dos Estrunfes.
(2) A Paródia, 10 de novembro de 1906, p. 1, Hemeroteca Municipal de Lisboa.
(3) Ferrão, Manuela – O busto da República. Lisboa, Assembleia da República, 2006, p. 6.
Ilustração do separador: Sofia Cavalheiro.