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EDUCAÇÃO DA JUVENTUDE (1967)

Na sessão de 16 de dezembro de 1966 da Assembleia Nacional, o Deputado Manuel Braamcamp Sobral apresenta um aviso prévio sobre educação da juventude. O debate tem lugar no mês seguinte, dando origem à aprovação, no dia 25 de janeiro de 1967, de uma moção que exprime a necessidade urgente de definir uma política de juventude que permita valorizar as novas gerações na "conjuntura internacional" e na "situação política, económica, social e espiritual das várias parcelas que integram o espaço português".
Maria Ester de Lemos. Arquivo Histórico Parlamentar.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, nos anos 60. Arquivo Histórico Parlamentar.
Na véspera, a Deputada Maria Ester de Lemos faz uma longa intervenção sobre a educação da juventude, começando por clarificar o seu entendimento sobre os termos "juventude" e "educação".

A juventude que está em causa é "a juventude portuguesa da metrópole e do ultramar, a dos meios operários e a dos meios rurais, os filhos-família e os filhos da rua". No que diz respeito à educação, esta não se esgota na preparação profissional dos jovens, baseia-se antes na "formação do caráter, da consciência patriótica do sentido da disciplina, do espírito de sacrifício e da devoção a ideais que transcendem o da eficiência profissional, o do bem-estar material e o do triunfo económico".

De seguida, analisa três pontos que considera problemáticos na educação da juventude portuguesa.

1. Promoção da mulher

O primeiro ponto diz respeito à "promoção feminina" na sociedade portuguesa, com a mulher – "trave mestra do edifício moral que chamamos o lar" – a deixar a vida doméstica e a desempenhar funções profissionais. Este abandono da vida familiar torna as mulheres incapazes para a tarefa de educar os filhos, uma vez que se encontram "exaustas, enervadas, absorvidas (…) pelas ocupações materiais inadiáveis" .

Ester de Lemos afirma que nem todas as mulheres trabalham fora de casa por razões económicas, nomeadamente em "certas camadas sociais", argumentando que "mediante um pouco mais de economia, um pouco mais de modéstia no viver, uma parte das mulheres que trabalham fora do lar poderiam talvez consagrar-se à tarefa de governar a sua casa e criar os seus filhos."

No entanto, a Deputada defende que esta decisão das mulheres não é apenas fruto de uma "futilidade" ou de "um capricho egoísta", mas resulta da "influência poderosa da educação que elas próprias receberam".

Na crítica ao modelo de educação das crianças e jovens do sexo feminino, aponta o caráter "quase exclusivamente intelectual" do ensino, a dispensa da participação nas atividades da Mocidade Portuguesa Feminina ("norteadas pela preocupação de acarinhar a vocação materna da mulher"), a valorização dos bons resultados escolares e a ausência de participação nas tarefas domésticas. Conclui que este modelo prepara a mulher para a vida profissional e "pouco ou nada para o lar", lançando as jovens no "mundo dos homens" e na "ambição do ganho".

A oradora apela, assim, aos poderes públicos que interfiram, através da escola e das organizações femininas, no desenvolvimento nas jovens de um "escrupuloso e reto sentido do seu dever específico de renúncia e uma vontade forte que lhe permitam (…) limitar-se e conter-se, aceitar um estilo de vida mais modesto, sacrificar alguns divertimentos e alguns triunfos mundanos ou profissionais". Assim, é necessário que a educação feminina tenha como objetivo entusiasmar as jovens para a "missão de mulher mãe de família".

Mas, além da questão da educação feminina, Ester de Lemos defende que os poderes públicos devem ainda regulamentar o trabalho das mulheres casadas e com filhos, melhorar o salário dos chefes de família e encontrar soluções para o problema da habitação das classes menos favorecidas.

2. Mendicidade juvenil

O segundo ponto abordado diz respeito à mendicidade e à vadiagem de crianças e adolescentes. Os "bandos de crianças" a pedir esmola ou a vender mercadorias demonstram, segunda a Deputada, a "flagrante desigualdade no plano (…) da educação no sentido moral".

Atribui a responsabilidade às famílias que atiram precocemente os filhos para a mendicidade e, consequentemente, para a "abdicação da dignidade natural, para o ódio, para o expediente, a mentira (…), o relaxamento moral".

Mas não basta a frequência escolar para a "reabilitação e progresso moral a que os pais não tiveram acesso", é necessário "tirá-los na rua". Reflete sobre a possibilidade da criação de uma “polícia feminina que se ocupe com energia e com carinho, destes casos de crianças em perigo moral, filhos atuais dos antros de alcoolismo e promiscuidade. Mas, acrescenta que a eficácia deste corpo de polícia depende do rigor no recrutamento e de um valor remuneratório elevado.

3. Organizações juvenis

Ester de Lemos prossegue caraterizando a juventude como uma "classe à parte", reivindicativa e combativa em relação à sociedade, mas também permeável a ideologias e modas.

A Deputada defende que a impulsividade da juventude, não podendo ser contrariada, deve ser orientada no sentido construtivo por "adultos responsáveis pela educação – pais, pedagogos, hierarquias religiosas ou estaduais".

No entanto, as organizações de juventude podem resultar de associações espontâneas de jovens, como o caso de algumas associações académicas, que conduzem a "desvios e desmandos (…) numa época de libertinagem do espírito e de relaxamento dos costumes" e que, pela sua rebeldia e caráter oposicionista, atraem muitos jovens.

De acordo com a parlamentar, é a hesitação dos adultos que provoca essa situação, pois "se querem e não querem que os jovens se organizem, também querem e não querem organizá-los. E desta hesitação "de meias concessões e meias proibições" resultam "atos extremos de protesto e arruaça" e a repressão das forças policiais.

Em oposição às associações espontâneas, Ester de Lemos faz a apologia das organizações nacionais de juventude, "com origens e fins fixados por adultos", criticando o sucessivo enfraquecimento da Mocidade Portuguesa, uma organização "orientada num sentido plenamente cristão e português".

A moção sobre a educação da juventude, aprovada pela Assembleia Nacional no dia seguinte, apela a que considere na política de juventude, entre outros aspetos, a proteção à família, a importância da Igreja na educação, a valorização profissional dos jovens, o prolongamento da escolaridade obrigatória para seis anos, a melhoria dos meios de ação social escolar, o alargamento da prática do desporto, o apoio às organizações juvenis Mocidade Portuguesa e Mocidade Portuguesa Feminina, o fomento da "boa literatura", dos espetáculos e dos programas de televisão e rádio com funções educativas, a intensificação da "fiscalização e repressão das atividades que atentam contra a moral e os bons costumes" e a mobilização da opinião pública relativamente ao "esforço da juventude na defesa do Ultramar".
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